Em meados de janeiro de 1971, José Antônio Nogueira Belham tirou férias para descansar de seu período à frente do DOI-Codi do 1º Exército, no Rio de Janeiro. Foi esse argumento usado pelo general, em 2013, para tentar se desvencilhar do assassinato de Rubens Paiva durante as investigações conduzidas pela Comissão Nacional da Verdade (CNV). No entanto, documentos e testemunhas desmentiram a versão apresentada pelo oficial das Forças Armadas.
Entenda o caso:
- José Antônio Nogueira Belham, um oficial do Exército, foi apontado como um dos autores do assassinato do ex-deputado Rubens Beyrodt Paiva
- Belham alegou que estava de férias no dia da morte de Paiva, mas documentos mostraram que ele fez deslocamentos sigilosos no dia em que político foi preso
- No relatório da CNV, general é ligado a 19 e mortes durante a ditadura militar.
- Oficial continua recebendo uma remuneração de R$ 35.991,46 e aparece a patente de marechal.
- Em 2014, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou Belham e outros quatro militares pelo crime, mas o processo aguarda análise sobre a aplicação da Lei da Anistia para avançar
O general alegou que não estava no seu destacamento no dia 21 de janeiro de 1971, suposto dia da morte de Rubens Paiva, e que não teve envolvimento com os crimes ocorridos no local. Em contrapartida, a folha de alterações funcionais de José Antônio Nogueira Belham, obtida pelo CNV, identificou que o militar fez deslocamentos sigilosos com saque de diárias nos dias 2, 5, 8, 11, 14, 17, 20, 23, 26 e 29 de janeiro daquele ano.
Vale ressaltar que em 20 de janeiro de 1971, um dos dias em que o oficial interrompeu as férias para fazer deslocamento sigiloso, é a data em que o ex-deputado federal foi levado para o DOI-Codi do 1º Exército. Quando o político chegou até o destacamento, foi elaborado um termo descrevendo os objetos pessoais que ficariam apreendidos no local durante a prisão.
De acordo com a comissão, constava no documento as seguintes informações manuscritas: “Obs: Dois cadernos de anotações encontra-se (sic) com o MAJ BELHAM. (Devolvidos os cadernos)”, com uma rubrica não identificada. Na época, o chefe do DOI-Codi do 1º Exército ainda era major.
Outro tópico que foi pertinente para ligar o membro do Exército Brasileiro ao assassinato de Rubens Paiva foram as oitivas com outros militares. Em 27 de janeiro de 2014, a CNV recebeu informações de uma testemunha ocular referida como “Agente Y”.
“Na oportunidade, tendo em vista as condições físicas do próprio senhor, tive o sentimento de que ele poderia não resistir. Não posso entretanto dizer se as condições físicas do Sr. Rubens Paiva tinham outros antecedentes, ou se este fato gerou a sua morte. Reafirmo, ainda, que comuniquei naquela data, ou seja, 21 de janeiro de 1971, este fato ao então Major Belham, que procurei e encontrei na sua sala de trabalho”, afirmou o homem.
O depoimento foi reforçado pelo relato do oficial do Exército Ronald José Mota Batista de Leão. O relatório final da CNV concluiu que Rubens Beyrodt Paiva foi morto quando se encontrava sob a guarda do Estado brasileiro, em contexto de sistemáticas violações de direitos humanos promovidas pela ditadura militar. José Antônio Nogueira Belham foi apontado como um dos autores pelo assassinato.
O Ministério Público Federal (MPF) apresentou, em maio de 2014, denúncia contra cinco ex-militares José Antônio Nogueira Belham, Rubens Paim Sampaio, Jurandyr Ochsendorf e Souza, Jacy Ochsendorf e Souza e Raymundo Ronaldo Campos envolvidos nos crimes cometidos contra Rubens Paiva.
Após a denúncia ter sido aceita, a defesa dos militares moveu uma reclamação no Supremo Tribunal Federal (STF), utilizando que a acusação poderia contrariar a Lei da Anistia. Recentemente, o ministro Alexandre de Moraes solicitou um parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre o julgamento de cinco militares.
Em 21 de novembro, a PGR apontou que é mais adequado aguardar a decisão do STF no âmbito do recurso extraordinário que trata da aplicação da Lei da Anistia. Três dos militares acusados pelo Ministério Público Federal (MPF) já morreram, restando vivo apenas José Antônio Nogueira Belham e Jacy Ochsendorf e Souza.
Na última quinta-feira (9/1), Moraes julgou prejudicada a reclamação da defesa dos militres ante a “perda superveniente do objeto”. Isso significa que a ação não possui mais objeto ou interesse visto que é necessário aguardar a análise sobre a aplicação da Lei da Anistia pelo STF.
Outras mortes ligadas ao general
Segundo as investigações da Comissão Nacional da Verdade (CNV), como diversos outros oficiais durante os anos da ditadura militar, José Antônio Nogueira Belham era uma figura central nas violações de direitos humanos, especialmente no contexto do Destacamento de Operações de Informações do Exército. A autoria do general é indicada, no relatório final da CNV, em pelo menos 19 mortes.
Lista de mortos e desaparecidos relacionados a José Antônio Nogueira Belham:
Conforme o Metrópoles noticiou anteriormente, de acordo com o Portal da Transparência, Belham segue recebendo uma remuneração básica bruta de R$ 35.991,46 enquanto vive em Brasília, no Distrito Federal. O homem também aparece com a patente de marechal, considerada uma honraria voltada apenas a oficiais do Exército Brasileiro que tiveram atuação excepcional durante o período de guerras.
Defesa
A reportagem busca contato com a defesa do general José Antônio Nogueira Belham para solicitar esclarecimentos. Não houve retorno até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto para eventuais manifestações.